Dividir moradia ou alugar quartos tem sido alternativa de jovens no Recife
Por Arthur Ferraz
Sair da casa dos pais e conquistar a independência financeira é um longo processo de crescimento pessoal e profissional que requer, além de força de vontade, paciência e planejamento. Por isso, é comum, no início da carreira, as pessoas alugarem um imóvel compartilhado com amigos ou até desconhecidos para poder reduzir os gastos e, assim, juntar dinheiro até atingir o sonho da casa própria. E num momento de crise econômica, também é vantajoso para o proprietário disponibilizar um apartamento ou um quarto para aluguel como forma de adquirir uma renda extra durante o mês.
É o caso da administradora Alessandra Papini, de 43 anos, que desde 2013 tem alugado dois quartos do apartamento onde mora, no bairro de Boa Viagem, Zona Sul do Recife. Para ela, que tem pais idosos, esse dinheiro ajuda a pagar as contas. “Meu pai é aposentado e ele e minha mãe têm problemas de saúde, então [o aluguel] é um incremento importante. Por enquanto estou sem alugar, porque está tendo um vazamento no prédio, o que altera extremamente a receita”, conta.
As vagas eram oferecidas só para mulheres e custavam R$ 500 e R$ 750 por mês, de acordo com o tamanho do cômodo. Os valores também incluíam estacionamento. “Alugar um quarto é muito mais simples e me dá muito menos despesas do que se disponibilizasse um apartamento inteiro, porque toda a responsabilidade financeira de pagar condomínio, energia, IPTU, internet é minha. E é uma forma de controle, estou sempre lá vendo se estão usando de forma adequada. Até hoje nunca tive problema com nenhuma hóspede”, afirma.
Já para quem divide um apartamento, a economia é uma grande vantagem. A produtora cultural Renata Farias, de 30 anos, que mora com a executiva de pré-vendas Cleide Correia, de 28, diz que deixa de gastar, no mínimo, R$ 300 por mês só por compartilhar o imóvel. “Em média, cada uma banca de R$ 600 a R$ 700 mensais. Se fôssemos morar sozinhas, certamente procuraríamos lugares mais baratos e corte de gastos. Como dividimos as contas, alivia muito a nossa situação e nos possibilita certos ‘luxos’”, ressalta.
O contrato está no nome das duas amigas, que já dividiram outro imóvel antes. “Tivemos que juntar nossas rendas para poder dar entrada na imobiliária e os fiadores são os meus pais. No outro apartamento, cheguei a pensar em morar só e decidi esperar um ano para que Cleide pudesse se organizar. Mas encontramos um apartamento maravilhoso, fiquei apaixonada por ele e disse que não sairia mais de jeito nenhum”, recorda Renata.
O desafio é ainda maior para os que precisam se mudar para outra cidade onde não têm nenhum conhecido. Antes mesmo de achar um lugar, é importante checar onde e em que condições está sendo oferecido o imóvel para não ser enganado. No mercado, aplicativos e sites ajudam esse público a encontrar hospedagem ou moradia. Entre eles, está o Moove In, que reúne pessoas que pretendem morar em um local compartilhado com base no perfil dos pretendentes traçado a partir de um questionário online e ainda usa informações coletadas nas redes sociais.
Compartilhar exige parceria
Numa casa nova, sem a família por perto, é preciso sempre tomar cuidado para manter uma boa convivência com os outros moradores e evitar conflitos. Para que isso aconteça, a psicóloga Juliana Santos, do Hospital Memorial Jaboatão, defende que tanto o dono do imóvel quanto os novos inquilinos estabeleçam regras que garantam o respeito mútuo entre eles. “Eu acho importante ter essas regras claras. Se na casa dos pais, com os irmãos, cada um tem sua personalidade e já gera conflitos, imagina pessoas que vêm de famílias diferentes?”, questiona a especialista.
Ainda de acordo com a profissional, para garantir um convívio saudável, todos devem ter em mente pelo menos três palavras-chave: respeito, educação e comunicação. “Esses são os principais pontos. Se um vai dormir ou estudar em determinado horário, o outro deve fazer menos barulho nessa hora. Isso é uma coisa que precisa ser acordada. Se for receber alguém de fora, como um familiar, tem que haver comunicação para que as outras pessoas estejam cientes. Ou então se estabelece desde o início a regra de não receber ninguém”, explica. Foi o que Alessandra Papini fez no apartamento dela. “A gente tinha um acordo de convivência, principalmente em relação a receber namorados e fazer festas. Se fosse receber alguém, não ficava lá. Tem uma área comum, como a sala e a cozinha, mas se você fica muito tempo na sala, por exemplo, pode tirar a privacidade das outras pessoas. Já aluguei para gente bem jovem e nunca aconteceu nada. Acabo fazendo novas amigas”, afirma a administradora.
A produtora cultural Renata Farias também acredita que o respeito à individualidade do outro é fundamental quando se divide um apartamento. “Nós já vivemos juntas há um tempo, e isso nos possibilitou maior conhecimento, não só como amigas, mas também como pessoas. Pegamos o feeling uma da outra, respeitamos nossos espaços e compartilhamos muitos momentos”, conta.
As duas fazem alguns acordos sobre a limpeza e as refeições. “Antes de termos uma diarista, nós dividíamos os ambientes ou as funções. Também já tivemos o acordo ‘gatos/plantas’, que estabelece o revezamento no cuidado com eles durante a semana”, explica Cleide.
Dividir com responsabilidade
Para diminuir ainda mais os custos e o valor do aluguel, alguns inquilinos resolvem chamar mais uma pessoa quando há um quarto vago. De acordo com o advogado José Almeida de Queiroz, consultor jurídico da Fecomércio-PE, essa prática, conhecida como ‘sublocação’, está dentro da lei, mas só deve ser feita com o consentimento do proprietário do imóvel. Caso contrário, o contrato de sublocação pode ser anulado. “O sublocatário assumirá toda a responsabilidade em caso de eventuais danos ou descumprimento contratual”, alerta.
Há quatro anos dividindo um apartamento com uma amiga, na Cidade Universitária, Zona Oeste do Recife, a jornalista Marília Rêgo, com 21 anos, costuma abrigar outras pessoas para reduzir as despesas. “No começo, veio uma menina de Limoeiro, que passou uns seis meses e depois foi morar em outro lugar. A gente então passou um tempo sozinha até que chegou outra do Ceará. Ela ficou aqui até passar num concurso e indicou uma amiga, colombiana, que está morando com a gente agora”, conta.
De acordo com ela, apesar de não estar prevista originalmente no contrato a possibilidade de convidar outros inquilinos, o dono do apartamento sabe que há uma terceira pessoa na casa e nunca viu problema nisso. “Ele ajuda muito a gente, sempre vem aqui e pergunta se está precisando de alguma coisa. O contrato está no nome da minha mãe e não consta nada sobre quantas pessoas, isso é a critério da gente. Todo mês tem que pagar o aluguel, mas, independentemente disso, quantas pessoas quiser colocar a gente bota”, afirma.
O advogado José Almeida de Queiroz ressalta, no entanto, a necessidade de se fazer um documento como forma de evitar complicações jurídicas, tanto nos casos de aluguel compartilhado quanto de sublocação. “O importante é ter a autorização do proprietário porque, com ela, não há contestação. Deve-se fazer o contrato indicando de forma clara e precisa o espaço que está sendo cedido a cada participante. Também é importante comprovar a regularidade
de cada compartilhado, perante os órgãos oficiais, quanto às obrigações fiscais e trabalhistas, evitando, no futuro, medidas judiciais”, recomenda.
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