Por Mariana Mesquita
Diante da retração econômica, é preciso fugir dos juros altos e buscar alternativas
Não é nenhuma novidade dizer que os índices de endividamento e de inadimplência são preocupantes no país. Os dados de julho da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC) refletem uma situação complicada, em que 43,7% das famílias com renda de até dez salários mínimos, consideram-se “muito” ou “mais ou menos” endividadas, tendo seus rendimentos comprometidos com dívidas como cheques pré-datados, cartões de crédito (apontado por 93,5% das famílias), carnês de lojas, empréstimo pessoal e prestações de carro e seguros. Porém, como frisa a economista-chefe do SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito), Marcela Kawauti, “uma pessoa endividada não é obrigatoriamente inadimplente. O problema acontece quando a renda familiar fica muito comprometida ou quando se torna impossível pagar as parcelas estabelecidas”, explica.
Embora um estudo do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) aponte que 76% dos consumidores consideram que a vida financeira pessoal continuou igual ou pior do que em 2016, alguns indícios mostram que tanto o endividamento como a inadimplência têm melhorado nos últimos meses. “Dá para dizer que a situação parou de piorar, mas a melhoria efetiva só deve se apresentar a partir de 2018, a depender do andamento das questões eleitorais e de outros fatores”, aponta Marcela.
De acordo com os dados da PEIC, o percentual de endividados melhorou em relação ao mesmo período do ano anterior. Conforme cita Rafael Ramos, economista do Instituto Fecomércio, Pernambuco saiu de 68% de endividados, em junho, para 67,6% em julho de 2017. O dado se mostra ligeiramente melhor que no mesmo período do ano anterior, quando o percentual era de 67,8%.
“Já era esperado que houvesse uma queda no endividamento do estado em julho, pois o mês não possui nenhuma festa de grande apelo emotivo. Apesar das férias, em 2017, julho foi impactado negativamente pelos altos índices de chuvas que ocorreram em Pernambuco, o que acabou segurando parte do consumo potencial”, comenta Rafael, referindo-se ao cenário retratado pela PEIC. Ele destaca que alguns indicadores (como a inflação, a geração de empregos formais, a redução dos juros e o crédito menos restrito; além da liberação do saldo das contas do FGTS inativo) vêm aos poucos recuperando o poder de compra da população. Por sua vez, Marcela Kawauti cita que uma explicação para os índices menores de endividamento está no comportamento dos consumidores, que refreiam suas intenções de compras diante da insegurança do mercado e na postura dos bancos e do comércio que têm oferecido menos facilidade de crédito.
Técnico em Segurança do Trabalho, Enoch Leite (foto) viu o mercado, para sua profissão, deteriorar-se ao longo dos últimos anos, com a onda de demissões ocorrida no polo de Suape e a crescente oferta de cursos na área, aumentando a concorrência para a função. Após trabalhar como professor em escolas técnicas e como auxiliar administrativo, desde 2015 ele está desempregado, sobrevivendo como artesão e recebendo uma remuneração flutuante. “Em determinados meses, recebo bem. Em outros, a renda é mais baixa. Eu insisto porque é um trabalho digno e tinha como proposta ser um complemento. Mas, atualmente, é nossa fonte de renda mais certa”, conta ele.
Em 2016, a esposa de Enoch também foi demitida e a família, desde então, conta com empreitadas incertas para dar conta das dívidas. Cortaram plano de saúde e supérfluos, como a TV a cabo e as viagens esporádicas. Negociaram as dívidas com o plano telefônico e suspenderam o serviço fixo. Por medo de não conseguirem honrar com as parcelas, também cortaram os cartões de crédito. Obtiveram um bom desconto na escola do filho e, por estarem os dois sem renda fixa, conseguiram registro para poder prestar concursos públicos de graça e ter abatimento na conta de energia elétrica.
“A saída é tentar achar outras formas de ganhar dinheiro e até, em alguns casos, se sacrificar e se desfazer de algum bem, porque arcar com os juros altos é pior”, alerta Marcela Kawauti. Para ela, “todos os serviços essenciais que correm o risco de ser cortados devem ser prioridade, assim como o pagamento dos cartões e cheques especiais, que podem se transformar em dívidas mais altas”.
A negociação de dívidas também representa uma ótima alternativa. Para isso, é possível se dirigir às próprias empresas, contar com auxílio de defensorias públicas e comparecer aos mutirões periódicos de renegociação de dívidas, promovidos por órgãos como o Procon e o Serasa (ocasiões em que costumam ser oferecidos descontos substanciais nos juros e parcelamentos diferenciados). Veja abaixo algumas dicas dos economistas ouvidos nesta matéria e do portal Serasa Consumidor.
Como fazer negociação de dívidas?
1. Analise o contrato firmado. Verifique se não possui cláusulas abusivas ou que já definam as questões de inadimplência.
2. Veja sua situação financeira, saiba quanto recebe e quanto gasta, para saber quanto sobra e, a partir daí, pensar em uma negociação.
3. Defina um valor limite para negociar e não assuma um compromisso com o qual não possa arcar.
4. Se não houver sobras, é preciso cortar os supérfluos para não prolongar o transtorno. Busque ideias para gerar renda extra.
5. Pesquise propostas de outras instituições, migrando a dívida para outro banco que apresente algo mais realista e tangível.
6. Não se intimide em negociar. Busque uma negociação que aconteça pessoalmente, aumentando o poder de barganha.
7. Chegando ao acordo, mantenha todos os contatos e visitas protocolados, registrando tudo que ficou acordado.
Como evitar novas dívidas?
1. Compreenda seu real padrão de vida. Gaste baseando-se em quanto ganha e analise quanto precisa poupar para ter uma reserva em caso de imprevistos.
2. O maior vilão do endividamento é a utilização inconsciente do cartão do crédito e do cheque especial. Utilize apenas quando houver real necessidade.
3. Enxergue seu orçamento de médio e de longo prazo. Não se torne refém do cheque especial, do rotativo de cartão de crédito e outras fontes com juros estratosféricos. Procure reservar pelo menos 5% da sua renda mensal para imprevistos, mesmo enquanto paga eventuais dívidas.
4. Há uma série de ações judiciais favoráveis a consumidores que tiveram retenção de salário depositado em conta superior ao percentual de 30% do rendimento mensal.
5. O Código de Defesa do Consumidor proíbe ameaça, coação e qualquer tipo de constrangimento à pessoa endividada.
6. Se receber carta de cobrança dizendo que está sujeito à penhora de bens, lembre-se de que não podem ser penhorados salário, imóvel único da família, móveis e utilidades domésticas como geladeira e fogão e poupança de até 40 salários mínimos que seja anterior à dívida.
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